Bolsonaro edita MP para perdoar até 92% em dívidas de estudantes com Fies
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Medida ganhou fôlego em embate eleitoral com Lula e beneficia estudantes que aderiram ao fundo até 2017
O presidente Jair Bolsonaro (PL) editou MP (medida provisória) para permitir a renegociação de dívidas com o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies).
Estudantes inscritos no CadÚnico (Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal) ou beneficiados pelo auxílio emergencial podem receber desconto de até 92% do valor devido.
Nos casos restantes, o abatimento máximo é de 86,5%. Estas medidas beneficiam alunos que aderiram ao Fies até o 2º semestre de 2017 e apresentam débitos vencidos e não pagos há mais de um ano.
A MP foi publicada em edição extra do Diário Oficial da União de quinta-feira (30). Pressionado pela provável candidatura em 2022 do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Bolsonaro decidiu dar fôlego à proposta, como mostrou a reportagem.
A MP também permite receber desconto de 12% em dívidas vencidas há pelo menos 90 dias, com abatimento de 100% dos encargos moratórios, caso o pagamento seja feito à vista. Também há opção de parcelar estes valores em 12 anos e meio (150 meses), mas sem o desconto de 12% sobre o valor total.
Em transmissão nas redes sociais no começo de dezembro, Bolsonaro imitou Lula ao citar uma medida em estudo para beneficiar os estudantes.
“Tem gente que fica prometendo: ‘Se eu for presidente, vou anistiar todo mundo’. Por que não fez lá atrás, pô? Está aí de sacanagem”, disse Bolsonaro, simulando a voz do petista.
Uma semana antes, o petista havia dito no podcast Podpah que é preciso “anistiar os meninos” do Fies.
“Tem um milhão de meninos e meninas devendo para o Fies, porque não podem pagar. Anistia essas crianças. Qual o prejuízo para o país? Tem tantos empresários que dão calote, o que custa anistiar os meninos?”, afirmou.
A renegociação de dívidas do Fies deverá ser realizada por meio dos canais de atendimento disponibilizados pelos agentes financeiros.
“Vale dizer que essas modalidades de transação são aquelas realizadas por adesão, na cobrança de créditos contratados com o Fies até o segundo semestre de 2017 e cujos débitos estejam: I) vencidos, não pagos há mais de trezentos e sessenta dias, e completamente provisionados; ou II) vencidos, não pagos há mais de noventa dias, e parcialmente provisionados”, afirma nota da Secretaria-Geral da Presidência.
A ideia é não ter custo fiscal, pois a MP trata de empréstimos considerados irrecuperáveis, dizem integrantes do governo.
Em vídeo divulgado nas redes sociais na quinta-feira (30), o ministro da Educação, Milton Ribeiro, disse que a MP é “mais uma vitória do governo federal”.
“Ciente dos anseios da população e visando mitigar os efeitos da pandemia, o governo federal se solidariza com estudantes ao proporcionar opções para que os graduandos permaneçam na busca dos seus sonhos e alcancem o tão almejado diploma de nível superior”, disse Ribeiro.
Já aliados do ex-presidente Lula ironizaram a edição da medida. “Bolsonaro copia projeto do PT e concede perdão para estudantes com o Fies”, escreveu o deputado federal e secretário-geral do PT, Paulo Teixeira (SP), no Twitter.
Lula lidera as pesquisas para as eleições a presidente em 2022, com Bolsonaro em segundo. Além disso, a entrada do ex-aliado e ex-ministro da Justiça Sergio Moro (Podemos) na disputa ao Planalto também tem irritado o presidente, pois ambos miram uma parcela semelhante do eleitorado.
Parte das dívidas do Fies já são contabilizadas como prejuízo para a União, dependendo de fatores como o tempo em que as parcelas estão inadimplentes. O Balanço Geral da União registrou um ajuste para perdas de R$ 27,9 bilhões no Fies ao fim de 2020.
No total, o Fies tem a receber dos devedores R$ 123 bilhões, segundo números atualizados em 30 de setembro, os mais recentes disponíveis.
De acordo com o documento do Tesouro Nacional, o Fies já atendeu mais de 3,4 milhões de estudantes. Desse total, 2,7 milhões ainda possuem contratos ativos (aqueles que ainda têm saldo a pagar ao fundo).
Estabelecido por lei em 2001, no governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB), o Fies passou por uma expansão significativa sobretudo a partir do governo de Dilma Rousseff (PT). Do total, 79% dos contratos foram assinados de 2011 em diante.
O programa é operado pelo FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação), vinculado ao Ministério da Educação, que solicita os recursos ao Tesouro Nacional.
O MEC divulgou na quinta-feira (30) que o Fies deve oferecer 110.925 vagas em 2022. “No primeiro semestre, os estudantes terão acesso a 66.555 vagas, 60%, e 44.370 vagas, no segundo semestre, 40% do total”, disse a pasta.
Em 2014 o Fies ofereceu o maior número de vagas para um ano, 732 mil. O programa encolheu e tem cerca de 100 mil vagas disponíveis a cada ano desde 2018.
Em abril, o ministro da Economia, Paulo Guedes, disse em uma reunião do governo que o Fies deu bolsa “para quem não tinha a menor capacidade” e citou suposto caso de um filho de porteiro que recebeu o financiamento mesmo com nota zero no vestibular. A fala gerou críticas ao governo.
Para se inscrever no programa, o estudante deve ter participado de alguma edição do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) entre 2010 e 2020. O participante precisa ter notas iguais ou acima de 450 pontos e nota diferente de zero na redação no exame. Outro critério é o da renda familiar mensal, que tem que ser de até três salários mínimos por pessoa.
Em grande parte, o Tesouro emite títulos públicos para obter o dinheiro, o que gera um impacto direto na dívida pública.
Pelo fato de seus riscos serem em maior parte bancados pela União, o programa é alvo frequente de análises dos diferentes governos e já passou por sucessivas mudanças para mitigar o risco para os cofres públicos.
O programa financia até 100% do valor dos encargos educacionais cobrados pelas instituições de ensino que aderem ao fundo, dependendo da renda familiar mensal bruta e do comprometimento com os custos da mensalidade.
Essa não é a primeira vez que o programa passa por flexibilizações, e renegociações já foram feitas ao longo dos anos, inclusive em 2019, durante o governo Bolsonaro. Em 2020, foram suspensos os pagamentos dos estudantes beneficiários durante a pandemia de Covid-19.
Bolsonaro também editou, neste mês, uma MP para ampliar o acesso de alunos egressos de escolas privadas ao Prouni. A medida foi questionada por parte da oposição. “Fui criticado, que estava elitizando o Prouni. Pelo contrário, estamos fazendo justiça”, disse Bolsonaro em transmissão em redes sociais na quinta.
A iniciativa para beneficiar os estudantes não vem de forma isolada. Como a Folha mostrou, Bolsonaro tem buscado anunciar medidas para reverter a queda da popularidade em 2022, quando tentará a reeleição.
A MP da renegociação das dívidas do Fies passou a valer no momento da publicação, mas perde efeito se não for aprovada pela Câmara e Senado em até 120 dias.
Fonte: Uol Notícias